OS OBSERVADORES
Roger Dee Ele deixou seu girocóptero no gramado escuro e circulou o casarão, evitando cuidadosamente o banho de luz das janelas abertas. A pistola de energia estava aconchegada e fria em sua mão, e seu pensamento correu desolado: “Aqui estou eu, Peter Manson, pacifista, idealista, reformador, pregador panfletário da tolerância e amizade - prestes a sequestrar um homem o qual é quase certo que o matarei no começo da manhã. Amanhã a transmissão listaria sua loucura com outras insanidades: crimes sexuais, suicídios, os tambores políticos rufando pelo próximo holocausto da inevitável quarta guerra. Guerra. — Eles estão indo longe demais, — disse, meio em voz alta.— As rotinas de intromissão deles foram bastante prejudiciais, mas outra guerra agora pode significar o fim de tudo. Ele encontrou o alienígena que se chamava Leonard Havlik numa brilhante sala de estudo repleto de livros, entre uma miscelânea de papéis dentro de uma pasta que levava o nome dele em letras douradas. Uma secretária ajudava, era uma garota magra com cabelos crespos da cor de cobre e olhos verdes claros. Manson esperou, tenso num esforço incomum. Em algum lugar, um pássaro gorjeou sonolento, e o vento noturno, perfumado com o cheiro de trevo pisoteado, soprou frio contra seu rosto úmido. De modo irrelevante, a cena interna o lembrava de sua própria sala de estudo silenciosa, onde havia trabalhado por dez anos para coletar as escassas informações de sua busca. Naquela época escrevera quatro livros, lutando com o zelo apostólico de um reformador tentando abrir os olhos dos homens para suas próprias possibilidades, e falhou. Ele não despertou sua espécie, mas encontrou os Observadores. O fracasso não foi sua culpa. Foi deles... A garota deixou a sala. Manson endireitou-se na sua janela, levantando a pistola de energia. — Saia, Havlik — ordenou. — Rápido, ou te transformo em pó onde você está. Observador! Sua caça levantou os olhos, assustado — um homem pequeno, escuro com um rosto fino, cansado com cabelo grisalho espalhado, uma cópia perfeita dos milhões de homens de negócios comum cuja camuflagem humana imitou. Manson arrancou a trava de segurança de sua arma, e Havlik entrou pela janela rapidamente, sem protestar. Manson o cutucou para o girocóptero e algemou-o pelos pulsos. — Nós, os terráqueos, temos um provérbio comprovado pelo tempo —Manson disse. — De acordo com ele você não consegue enganar todas as pessoas durante o tempo todo. Passei dez anos procurando por você, Havlik. E aqui estou eu. Ele ajustou o piloto automático para sua cabana em Green River. Segurou com cuidado sua pistola de energia, e inclinou o girocóptero para alçar voo dentro da noite. Havlik deu um leve sorriso, os olhos escuros brilharam com a iluminação do painel de instrumentos. — Ria enquanto pode — Manson disse severamente — já aprendi algo de vocês, Observadores. Saberei mais pela manhã. — Força foi desnecessária — Havlik disse inesperadamente — eu teria dado a informação a você de boa vontade, já que nossa missão aqui está encerrada. Os Kha Niish, que são nossos mestres, deram ordem para deixarmos a Terra. Hoje à noite. Manson o encarou. A segurança do alienígena alimentava sua raiva. — Você está mentindo. Vocês, Observadores, se misturaram entre nós por séculos, usando nossa própria ignorância para nos colocarem uns contra os outros. Vocês nos mantiveram em eterna confusão. Nos deixavam surdos com nossas brigas enquanto vocês aumentavam o controle sobre nós. Agora vocês estão provocando uma quarta guerra que pode nos aniquilar completamente para poupar o trabalho de acabar com a gente diretamente. Vocês nunca sairiam agora, com o sucesso quase em suas mãos. — Talvez você tenha confundido nossas intenções — Disse Havlik. — Como você sabe que tem razão? — Porque os próprios homens por si mesmos não fariam coisas brutais e idiotas que enchem as transmissões todo os dias — Disse Manson. — Somos um povo social, ansiando por afeto. Por que deveríamos mentir, roubar e assassinar uns aos outros, aos milhões? O Ser humano é um animal racional, embora não se comporte de maneira racional. Por simples indução, a causa básica das idiotice social vem de fora de si mesmo. Alguém, ou alguma coisa, está nos colocando um contra o outro. Eu já suspeitava disso há dez anos, e nesta noite eu provei. Havlik deu de ombros. — Você está desperdiçando seu tempo. Nós deixaremos a terra hoje à noite. Manson riu brevemente. — Você não vai a lugar nenhum, meu amigo. E preciso de você para obter informação. O que mais você quer saber? Nossos motivos para desistir da Terra? — Vocês não vão embora de jeito nenhum. — Manson falou irritado — Você podem ter planejado um salto de rotina para a base de vocês em Plutão, mas não vão desistir de uma ameixa suculenta como a Terra. Não depois de todos esses anos! Ele olhou pela janela de vidro do girocóptero procurando pelo cume branco de green montain para verificar sua posição. O brilho do céu de Denver cintilou no leste, mas o cume se perdeu na escuridão. —Você não entendeu nossos motivos — Disse o alienígena. — Embora esteja certo sobre nossa base em Plutão. Indução de novo? —Num nível diferente, sim — Disse Manson. — Plutão é uma anomalia solar. Um planeta pequeno e pesado onde não deveria haver nada mais do que um mundo maior e mais leve. Plutão nunca nasceu no Sol. É um planeta alienígena trazido por vocês, o Observadores; Uma luz vermelha piscou no painel de controle, e o girocóptero desviou levemente. Uma linha de combustão do exaustor avermelhado do foguete ardeu em chamas à frente e desapareceu, explicando o desvio. — O expresso Seattle-Miami — murmurou Manson. Então o ângulo não natural da trilha do escapamento foi registrado, perturbando-o. — Mas ele não devia cruzar meu curso. E devia estar subindo e não descendo! — Sua Cruzada é baseada numa premissa falsa — Havlik falou. — Viemos à Terra há menos de 50 anos, não para destruir a humanidade, mas para guiá-la. Os Kha Niish nos enviaram como missionários para plantar a semente da cultura benigna deles entre os seres humanos como nós as plantamos entre as milhares de outras novas raças nascidas nas galáxias deles. O girocóptero se inclinou, descendo numa espiral para aterrissar. Uma casa da fazenda com suas janelas alegres e iluminadas contrastando com o campo escuro, surgiu em sua direção. Ao lado da casa, em pé, como uma caixa gigante de cilindros, Manson viu uma carga lustrosa e brilhante de uma nave. Ele levantou os incrédulos olhos para encontrar o olhar escuro do alienígena. A compreensão o surpreendeu. — Seu demônio — ele respirou. — Você me enganou de alguma forma. Estava brincando comigo de gato e rato desde o início! Ele lembrou da arma em sua mão e a levantou. — Deixe sua arma cair — Disse Havlik. — Você ajustou o piloto automático na minha direção. Este é o nosso ponto de evacuação. A arma escorregou pelos dedos de Manson. Ele tentou recuperá-la do chão e gritou, assustado, quando seu corpo se recusava a obedecer. O alienígena removeu suas algemas. —Você estará livre novamente assim que decolarmos. — Mentiras — Manson pigarreou. Lutou para quebrar o estase que prendia. Veias saltavam de sua testa com o esforço. — Eu devia saber! O girocóptero pousou gentilmente, a cem metros do cilindro. Um enxame de vultos estavam em volta da nave, subindo por uma grnde rampa, embarcando de modo ordenado. A garota que Manson vira na vila veio correndo na direção do girocóptero, os cabelos cor de cobre voavam ao sabor do vento noturno. —Você estava quase atrasado — ela gritou para Havlik. — Estamos prontos para... — ela percebeu o terráqueo e parou. Nas profundezas escuras dos olhos dela, Manson viu compreensão e uma grande pena, e pela primeira vez concluiu que Havlik não tinha mentido. Eles podiam ser extraterrestres, mas não destruidores. Nessa garota ardia os mesmos ideais, o mesmo zelo que o guiara. Ela era tão humana, basicamente, quanto ele. “A mesma vontade de erguer os desamparados está em nós dois. A compulsão de levar a luz salvadora da razão àqueles que se encontram nas trevas. — Espere — Implorou. — Seu mestre não teria mandado vocês embora se a Terra precisasse de você. E se os homens podem trabalhar em sua própria salvação, Então eles não precisam de mim também! Leve-me com você lá fora, deixe-me ajudá-los, deixe-me ver o exterior da galáxia de Kha Niish por mim mesmo! Ele falou para Havlik, mas seus olhos se fixaram na garota como um imã. Ela encontrou seu olhar pleno, a compaixão nos próprios olhos dela era mais profunda do que a dor. Havlik balançou a cabeça. — Sua sanidade não aguentaria a presença dos Kha Niish, nem das outras raças exteriores. Você é atraído a esta garota como outra de sua espécie, mas você acredita que os Kha Niish a moldariam à imagem deles? Ela é como o restante de nós, uma criatura androide, refeita pelos mestres para se adaptar ao ambiente de novo mundo que nós visitamos. O último dos vultos desapareceu dentro dos cilindros. Um gongo abafado ecoou através da noite. Uma voz chamou urgentemente. — Os Kha Niish não nos mandaram embora porque os humanos estão resolvendo seus próprios problemas — Disse o alienígena. — Nós os deixaremos destruir a si mesmos, conforme desejam, porque o ser humano é uma daquelas raras falhas do instinto galáctico. Vocês são uma raça de incorrigíveis. Mais tarde, Manson sentou-se letargicamente em seu girocóptero, esperando pelo retorno da vontade, do odor de terra queimada e do forte cheiro de ozônio e trevo pisoteado em suas narinas. “Nós, os terráqueos temos outro velho proverbio infalível”, pensou com amargura. “não se pode julgar um livro pela capa...” Por um longo tempo ele ficou sentado em silêncio, forçando os olhos a seguir o último rastro tênue do lançamento do foguete subindo em direção às estrelas. Então o estase que o segurava cedeu, e ele alcançou sua pistola de energia que estava sob seus pés. Editora Cyberus E-mail: [email protected] https://editoracyberus.weebly.com/ https://facebook.com/editoracyberus Instagram: @editoracyberus Twitter: @CyberusEditora Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Título original: The Watchers Publicação: Planet Stories, 1951, por Roger Dee Tradução: L. C. Braga Capa: svekloid Revisão: Maurício Coelho
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